domingo, 17 de abril de 2011

A internet e a festinha particular

Ontem, sábado, comecei a acompanhar a transmissão ao vivo, via Youtube, do sensacional festival californiano Coachella. Muitas bandas das quais eu nunca tinha ouvido falar tocaram (algumas me agradaram bastante), outras mais ou menos conhecidas também deram as caras, e a noite terminou com uma apoteose musical do Arcade Fire. Na última terça-feira (13/04), já tinha ido à loucura graças a uma transmissão de aúdio ao vivo, do portal Terra, do último show do U2 no Brasil. Bono, no alto de sua sabedoria, pediu aos fãs que registrassem aquele show, porque ele era especial. Era um estímulo nem um pouco velado à "pirataria" para uso próprio (porque para comercialização - perdoem o palavreado - é p*taria mesmo).

É sempre um alento ouvir da boca de um mega-super-hiper-ultra rockstar e mesmo de outros artistas de calibre ligeiramente menor que esse tipo de "pirataria" não deveria ser considerada um crime. Afinal, quantos artistas não ganham projeção e centenas de milhares de novos fãs graças ao download "ilegal" de músicas? E quantos desses novos fãs não lotam os shows desses artistas e acabam, por fim, comprando seus álbuns? E, nesse caso específico, qual é o mal de se registrar um momento único, que não necessariamente vai se transformar em um álbum oficial da banda - e, portanto, pode nunca mais estar disponível aos fãs?

Mas, enfim, nem era sobre isso que eu queria falar. Eu queria falar mesmo é sobre essa maravilha que a internet proporciona, com essas transmissões ao vivo de shows e festivais. Para mim, são como festinhas particulares, e ontem eu senti isso com ainda mais força quando eu, um amigo que mora em outra cidade e outro amigo que está na Argentina ficamos trocando ideias no Facebook enquanto assistíamos aos shows do Coachella. Era sábado à noite, em tese aquele dia da semana em que todo mundo quer ir mesmo é para rua, mas estávamos nós três - e, posso garantir pelos comentários no Twitter, milhares de outras pessoas em outras partes do mundo - em casa, assistindo, "de grátis", a um evento de grandes proporções e recheado de boa música.

É nessas horas que eu consigo dimensionar o quanto a internet mudou nossas vidas para melhor. Além de outros benefícios óbvios (e outros nem tanto), a Rede ainda nos proporciona poder fazer parte, mesmo que à distância, de acontecimentos com enorme capacidade de mobilização. Imaginem se, em 1989, pudéssemos ter acompanhado, pela internet, à queda do Muro de Berlim? Ou se (para quem é fã), em 1992, tivesse sido possível assistir a um dos shows da Zoo TV Tour, a turnê mais fanstástica que o U2 já colocou na estrada? 

Não é incrível poder se sentir parte de coisas tão grandiosas mesmo estando em casa, à frente de um computador? Eu agradeço aos Céus pela internet quando posso ter uma experiência do tipo. Se você não pode ir até a montanha, a montanha vem até você - e, quem sabe?, ainda pode render uma gravação que ficará para sempre no iPod.

sábado, 16 de abril de 2011

Da importância do isolamento

O ser humano é um ser social. Aliás, acredito que a maioria dos animais que povoa a Terra deva ter uma natureza gregária. Por anos (mas, ainda hoje), vivemos em tribos, nos dividimos em clãs, marcamos nosso pedaço de terra de acordo com crenças e leis que regiam e informavam pensamentos e ações dos indivíduos que faziam parte do todo. É bem provável que eu esteja redondamente enganada (historiadores e filósofos, me acudam), mas penso que a noção atual de indivíduo só tenha começado a tomar forma com o Iluminismo (toda aquela história do "Cogito ergo sum" e por aí vai).

Mas, por mais modernos e prafrentex e avançados e tecnológicos que sejamos, nós ainda mantemos algumas instituições que se orientam por uma lógica comum ao grupo, que delimitam o escopo de nossas decisões e nos levam, diariamente e aos borbotões, às salas de psicologos e psicanalistas, onde tentamos desfazer o emaranhado de noções alheias para encontrar nossa noção própria, nossos próprios códigos de conduta. Onde estaríamos sem essa teia de "eu penso"-s e "eu acho"-s que ouvimos todos os dias e internalizamos e confundimos com o que, de fato, pensamos e achamos?

O que você vê quando um mendigo cruza o seu caminho em uma calçada? Você vê um proscrito da Sociedade ou alguém que se libertou da teia? E quando você está indo trabalhar e entra uma pessoa no ônibus ou no metrô que desata a falar sozinha? É loucura ou é liberdade? Quantas vezes você não quis ser essa pessoa? A pessoa que abriu mão, consciente ou inconscientemente, do superego?

Mas, sendo todos nós seres funcionais (ou tentando ser), essa opção não é válida. É preciso manter um fio de normalidade que conduza nossas atitudes e nos mantenha o mais perto possível daquele quadradinho em que as regras ainda valem e você ainda é parte de um todo coletivo e dominante. O que nos resta então, se a loucura não é possível?

Penso que a resposta está no isolamento periódico da alma - seja por meio de uma meditação transcendental ou de umas porradas em um sparring - e na arte, em qualquer forma ou estilo. A arte é um pouco de loucura, mas ainda é uma loucura funcional, se é que isso é possível. E o isolamento da alma é o que permite a cura ou, pelo menos, a melhora temporária das feridas emocionais e psicológicas. 

O isolamento pode nos fazer, ainda, controlar e acalmar a ira. Não dá para matar ou socar todas as pessoas que tiram você do sério. Por mais que isso seja tentador. Eu que o diga.

sexta-feira, 25 de março de 2011

Os diversos estágios da raiva

Todo mundo já sentiu raiva um dia. Basta ser para sentir qualquer coisa, e raiva é um sentimento (ou sensação, ou estado de espírito) que é tão humano quanto chorar assistindo à cena em que a mãe do Bambi morre. Mas não é por ser algo assim, tão inerente à nossa existência, que não seja passível de sofrer alterações ao longo do tempo.

Passei a acreditar que passamos por estágios da raiva. Nada a ver com aquele Modelo de Kübler-Ross, ou os cinco estágios do luto. Não penso nos estágios da raiva como um processo contínuo, mas sim como gradações de raiva para as quais evoluímos (ou involuímos) à medida que amadurecemos e aprendemos a lidar com a terrível e inevitável verdade de que nem tudo na vida acontece conforme desejamos.

Já vivi o estágio primitivo da raiva, aquele em que nosso primeiro impulso é pegar o que estiver à nossa frente e jogar na parede - ou em alguém. Passei por um episódio assim há não muito tempo, por sinal (envergonho-me em admiti-lo - mas eu disse que esses estágios dependem do quanto o ser evolui ou involui. Não damos, muitas vezes, um passo à frente e dois para trás? Então...). Claro que o objeto foi jogado contra a parede, é bom que fique claro. Mas essa raiva, para chegar a esse nível, é porque mexe com algum ponto meu que ainda é muito sensível e pouco analisado/racionalizado. Quando a raiva está associada a/é resultado direto de algo que já foi razoavelmente processado por minha psiquê, sou capaz de senti-la de uma forma menos agressiva, mais silenciosa e serena (parece contraditório - e talvez seja mesmo).

Não sei até que ponto as poucas aulas de Hatha Yoga me ajudaram, mas hoje consigo me deparar com um situação complicada, passível de me enraivecer, e não reagir de forma colérica. Não é que eu não sinta raiva - eu simplesmente a processo internamente e converso com ela. É, eu dialogo com a minha raiva. E, quando isso acontece, eu normalmente concluo que o agente causador da raiva (seja uma pessoa, uma coisa ou uma situação) não é digno do mau uso da minha energia.

Acho até que dá para transformar isso em um axioma matemático. Quanto menor a significância do agente motivador, menor é a energia dispensada à raiva que ele provoca. Pense nisso quando pessoas ou coisas insignificantes, ou situações que fujam totalmente ao seu controle, te colocarem em um estado de raiva incontrolável. Processe o sentimento, converse com ele e fique em paz consigo próprio. Suas células agradecem.

terça-feira, 22 de março de 2011

Aprendendo novos truques

Você conhece aquele ditado - "a cachorro velho não se ensinam novos truques". À parte a impropriedade contra os cães idosos (que devem ser excelentes companheiros para quem os tem e os ama), o ser humano parece viver à sombra dessas palavras, como um destino do qual não se foge - é assim para todos nós, então para quê lutar?

Eu me peguei levando essa vidinha "mais ou menos", cheia de velhos truques (isso me lembra um outro ditado, o do pônei) e achando, conscientemente, que estava tudo bem - era assim que deveria ser. O lado inconsciente - aquele pobre que matamos todo dia um pouco mais -, já meio em coma, ainda teve alguma força para sussurrar no meu ouvido: "essa vida não te satisfaz".

Comecei a ouvir esse sussurro ouvindo música. Rolava aquele disquinho branco do Ipod e não achava mais nada que me satisfizesse. Eu gosto de (quase) tudo que estava na minha biblioteca musical, mas meu anseio era por algo que eu ainda não conhecia. Queria algo novo, mas não sabia o quê. Até que um feliz encontro com o acaso me abriu uma portinha que eu ainda não tinha visto no lusco-fusco do meu quarto metafísico.

Resumindo, em pouco mais de dois meses consegui matar um pouquinho dessa sede por novidade e, de quebra, ainda ganhei mais uma banda favorita de todos os tempos (e outra que entra fácil no Top 15). Fora o ganho emocional de recuperar o meu prazer em ouvir coisas novas, que eu havia posto de lado ao criar uma enorme resistência ao que se faz atualmente no rock mundial (é o meu estilo preferido, é bom esclarecer logo).

Pensava que, se eu cedesse aos apelos de uma só banda, seria uma vendida, uma traidora do movimento (a experiência de comprar - e depois odiar - o álbum de estreia do Strokes logo após o lançamento me criou um trauma profundo). Mas eu só estava traindo a mim mesma, à garotinha de 15 anos que assistia a todos os programas da MTV (na época em que ainda era um canal de música) e sabia o nome de todas as bandas nos Tops 10 e 20.

Essa garotinha acordou de novo, já à beira dos 30, e não quer recuperar o tempo perdido, porque o tempo não se perdeu. Mas ela não quer mais ser trancada numa portinha escondida, para dar lugar a uma adulta cheia de truques velhos. Essa garotinha de quase 30 conhece alguns novos truques e quer colocá-los em prática.

Então, você aí que está lendo, pode usar a área de comentários para sugerir truques novos, quer dizer, bandas novas para a blogueira que está com os ouvidos (muito) abertos. Quem sabe eu não ganho mais uma banda favorita?

segunda-feira, 21 de março de 2011

A imbecilização da mulher como um fenômeno social (?)

Em meu primeiro post, falei sobre como a propaganda brasileira robotiza e desensibiliza a mulher, retratando-a como uma super-mãe-esposa-profissional cujo sonho dourado é prover sua casa com amor, carinho, harmonia e limpeza, muita limpeza. É uma mulher faz-tudo, que, se bobear, ainda pinta as paredes e conserta o motor do carro do marido. Mas essa mulher não parece existir só nos comerciais de TV. Ela é real - muito real.

Hoje uma amiga perguntou-me se eu havia lido o último texto da Martha Medeiros, sobre o questionamento metafísico entre chutar ou não o pau da barraca, quando, em resumo, a mulher é o próprio pau que mantém a barraca em pé. Comentei que havia lido o texto, e que ele havia me agradado até o ponto em que Martha começa a digressionar sobre as vicissitudes da mãe-mulher-esposa contemporânea, cuja prole e marido não conseguem ao menos limpar suas partes íntimas sem a orientação da figura feminina, sempre presente. Foi aí que o texto começou a me irritar profundamente, porque tocou em um ponto bastante sensível para mim.

Essas mulheres "modernas" parecem sentir uma enorme satisfação e orgulho por poderem se queixar que, ó Céus, seus maridos e filhos não vivem sem sua infinita bondade. Elas vivem para uma espécie de diatribe em que os outros figuram como eternos vilões - são os filhos que não têm nenhuma responsabilidade ou independência, ou o marido que não se presta a dividir as tarefas domésticas - quando não é o chefe que não entende que hoje, justo hoje, ela está com uma cólica daquelas e, por isso, não está no humor para entregar um relatório com os resultados do trimestre.

Essa é aquela mulher que, cria da liberdade sexual do fim do século XX, foi programada para a independência financeira e para o sucesso profissional. E é essa mulher que, hoje - quase 50 anos depois de Betty Friedan ter escrito seu "The Feminine Mystique" e decifrado, em parte, o desespero feminino -, joga no lixo as conquistas de suas antecessoras e cria filhos incapazes de tomar as rédeas de suas próprias vidas (além de perpetuar o arquétipo do marido imprestável). Essa mulher é a mesma que se desespera quando percebe que o peso do mundo, que ironia, descansa todo sobre seus ombros cansados. Essa é a mulher que escolheu ser uma equilibrista porque acredita que é possível ser perfeita em todas as frentes - afetiva, familiar e profissional.

E com que direito essas mulheres - que fizeram escolhas e hoje pagam o preço devido por se acreditarem entidades dotadas de superpoderes - se entregam a queixumes? Suas vidas são fruto de escolhas equivocadas, superlativas, egocêntricas e narcisistas, mas o que seria delas se não houvesse um homem no meio do caminho a quem culpar?

Quando as mulheres acordarem para o fato de que são elas suas próprias inimigas, será muito tarde para nós?

A imbecilização da mulher na propaganda

Quem assiste à TV com alguma frequência já conhece o grande clichê dos comerciais de produtos de limpeza. É sempre a mesma historinha: uma casa, uma família, às vezes um animal de estimação e uma mulher vestida de "mãe" limpando o banheiro ou a cozinha para deixar o lar mais saudável para o maridão e prole.

Ora ela passa um esfregão no chão, ora ela esfrega o carpete, ora lava uma imensa pilha de pratos ou um cestão de roupas. Nunca se vê nem a sombra de alguém ajudando essa super-mulher, que, se seguirmos a lógica sócio-econômica e antropológica que rege nossos tempos, também deve ser uma p*ta profissional e ainda deve ter uma performance estelar no campo sexual.

Alguém conhece essa mulher? Ela existe de fato?

Para mim, não há dúvidas de que ela existe. Mas, em um país onde mais e mais homens trocam de posição com as mulheres (sem trocadilho) e assumem o comando do lar, não seria de se esperar que a nossa tão celebrada e competente propaganda acompanhasse a passagem do tempo e transferisse parte desse papel de super-mãe-esposa-mulher para o sexo oposto e explorasse isso em comerciais?

Lembro-me de um comercial de TV italiano que eu vi há muitos anos atrás (muitos mesmo - numa época em que eu ainda tinha disposição para assistir à RAI), no qual um homem é deixado sozinho em casa por sua mulher, depois que ela fez uma impecável limpeza na cozinha. Mal ele fica sozinho, e a cozinha vira um chiqueiro (porque ele resolveu, vejam só, cozinhar). Desesperado com a possibilidade de ser enxovalhado pela esposa, o sujeito limpa a cozinha toda com o mesmo esmero que sua mulher a limpara momentos antes. Quando ela chega, não percebe nenhum sinal do que ele havia aprontado, e ele respira aliviado.

Essa propaganda deve ter, pelo menos, uns 10 anos. A Itália é um país latino assim como nós e, também como nós, deve ter sua alta dose de machismo. Mas lá alguém já tinha acordado para a perceptível mudança de papéis, e resolveu capitalizar sobre isso. Por que isso ainda não acontece no Brasil? E, o que é ainda pior, por que a mulher ainda é retratada nos comerciais como uma boneca robotizada cujo maior objetivo na vida é tornar a casa mais limpa para que seus filhos possam brincar à vontade no chão? Por que essa mãe de comercial de TV ainda é um ser tão unidimensional, quase uma caricatura de dona de casa dos anos 50? Cadê a inovação e a criatividade, tão caras à nossa publicidade, nessas horas?

Esse fenômeno me faz pensar, também, na idiotização do adulto nos comerciais (mas isso é papo para outro post). Vivemos, de fato, em uma era comandada por crianças e adolescentes, e a publicidade não tardou em pular nesse bonde e retratar a Geração Z como uma grande força motriz, capaz de interferir em todas as decisões importantes tomadas no âmbito familiar. A idiotização da mulher, nesse contexto, é só mais um aspecto do que é esse começo de século XXI - um século em que pegamos todas as conquistas do últimos quarenta anos do século anterior e jogamos pela janela, sem dó nem piedade. São mulheres que largam a carreira por causa dos filhos, homens que abandonam suas esposas porque elas já "passaram da validade", adolescentes que engravidam porque acreditam que sexo e maternidade nada mais são do que uma brincadeira de casinha de adultos. É um século de regressão a velhos e infelizes padrões.

PS: Será que isso aqui é um passo na direção da inversão de papéis?

http://www.mulheresevoluidas.com.br/index.php

Veremos.